Após a análise de conjuntura social, apresentada, na quarta-feira, 15, pelo jurista Rubens Ricupero aos bispos do Brasil, reunidos em Assembleia, monsenhor Joel Portela Amado, pároco da catedral do Rio de Janeiro, fez longa reflexão sobre aspectos do rosto da Igreja no Brasil de hoje. No início da apresentação, já ficou claro que sua exposição responderia duas partes: “a realidade que interpela a Igreja e a Igreja que interage com a realidade”.
Realidade interpela a Igreja
“Uma palavra emerge com crescente vigor em nossos dias: perplexidade. Este é um termo que penso poder ajudar a compreender pastoralmente o que se passa neste mundo sob aceleradas transformações, não apenas no superficial, mas também e principalmente nas categorias mais profundas de compreensão da vida e consequente atuação sobre ela”, ponderou monsenhor Joel.
De acordo com Portela, diante da perplexidade, emergem algumas possibilidades de reação, as quais, na prática se misturam: lógica da flexibilidade e mobilidade nos critérios, em todos os campos, da vida, inclusive nos campos ético e religioso; lógica da individualidade, da solução de cada um, com grande dificuldade para olhar os sonhos; lógica do imediato, da solução a curto prazo, dos resultados que estejam ao alcance das mãos, com dificuldades para sonhos maiores e renúncias.
Igreja interage com a realidade
Monsenhor Joel apresentou alguns critérios por meio dos quais se vai interagir com as questões que chegam para a Igreja, considerando sempre as urgências na ação evangelizadora. Ele falou em três “vozes”. A primeira seria uma voz que tem se destacado e é muito ouvida: a voz do Papa Francisco: “Num mundo hoje, sem vozes nem lideranças significativas, o Santo Padre é, podemos dizer, unanimidade. Sua liderança moral é incontestável. Sua voz é ouvida, sua pessoa é admirada, sua presença é noticiada”.
Outro critério seria a expressão “voz acolhedora da Igreja” caracterizada pela “solidariedade a partir da cruz”. Segundo Joel é a Igreja que “não teme sujar-se nas lamas existenciais, correndo às pressas para as periferias, tenham essas periferias as formas que tiverem”. Um terceiro critério de interação da Igreja com a realidade atual seria representado por “uma voz que escuta”. “Creio que o Espírito tem dito à Igreja que, nestes e em todos os casos, a grande atitude é o acolhimento pessoal sob suas variadas formas. Acolhimento aqui não significa o atendimento incondicional das solicitações, fruto do medo de perder a freguesia, atitude mais própria de empórios religiosos do que da genuína ação evangelizadora”.
“Uma escuta que vai ao encontro” foi o quarto critério de interação apresentado por monsenhor Joel. “Outro aspecto a nos interpelar nestes tempos de perplexidade diz respeito à missão. Perplexidade e missão se articulam muito diretamente. O princípio é simples: maior a perplexidade, maior ainda deve ser a missão”, disse.
Na conclusão da reflexão, como um dos possíveis critérios de interação da Igreja com a realidade atual, monsenhor Joel apresentou o tema que foi aprofundado pelo papa Francisco na Bula do Ano Santo, lançada no último dia 11 de abril: a urgência da misericórdia. “Em tudo isso, importa identificar um viés apto a conduzir transversalmente a ação evangelizadora em nossos dias, fornecendo conteúdo, identidade, rosto, para tudo o que a Igreja fizer. A meu ver, este viés foi oficializado pelo papa Francisco ao convocar toda a Igreja para o Ano Santo da Misericórdia. De fato, a misericórdia é uma das maiores necessidades de nosso tempo. O que da Igreja se pede, neste momento da história, é que seja sinal transbordante e interpelador da misericórdia de Deus”, acrescentou.
Confira texto na íntegra da Análise Eclesial.