Por padre Manfredo Araújo de Oliveira
Quando pensamos hoje no processo de ampliação do espaço democrático convém lembrar as palavras fortes de Florestan Fernandes: a história do Brasil é fundamentalmente a história de um único ator, a classe dominante, pois no Brasil sequer se chegou a uma Revolução Democrática (inclusão social através do acesso aos direitos básicos) e Nacional (determinação de um projeto econômico livre da subordinação ao capital de fora). As elites brasileiras permitem que o povo entre em cena contanto que não se mudem os fundamentos que regem nossa configuração social. O DNA que constitui a sociedade brasileira é a do seu passado escravocrata, da grande propriedade e da monocultura o que explica o autoritarismo e a autocracia como nossos traços característicos. Nossas transições se deram sempre dentro desta ordem, sem rupturas profundas. Por isto o Brasil é uma eterna construção interrompida como dizia Celso Furtado.
Sem dúvida, o Brasil de hoje não é mas simplesmente o mesmo do tempo em que se elaborou este diagnóstico, mas o peso do que nos marca exige que examinemos com atenção as transformações que ocorreram em nossa história recente depois da redemocratização. A pergunta urgente é: caminhamos com firmeza na direção da efetivação da democracia? Podemos dizer que somos todos efetivamente sujeitos da configuração de nossa vida coletiva? A democracia implica que o governo se radique na soberania de todos o que no Brasil se faz através da eleição direta de nossos representantes para as diferentes instâncias de poder. Isto nos garante que todo poder emana do povo? Vemos hoje com mais clareza que não é o caso.
Tomemos o caso dos meios de comunicação como exemplo. Trata-se de uma questão muito delicada, pois qualquer tentativa de repensar sua configuração é logo interpretada como retorno à censura perversa que existiu durante a Ditadura Militar, um cuidado que a partir desta experiência histórica é compreensível. No entanto, só isto ainda não nos faz caminhar na direção do que realmente importa e é fundamental: a democratização dos meios de comunicação. A Democracia pressupõe o Estado de Direito e a participação livre dos cidadãos nos debates e decisões no que diz respeito a todos. Isto não pode ocorrer sem a formação da consciência que pressupõe sua expressão livre. Podemos dizer que há verdadeira liberdade de expressão com a hegemonia de poucos veículos de comunicação que sofisticadamente fazem passar à sociedade uma maneira única de pensar (permitindo variantes no mesmo quadro básico), de interpretar nossa realidade social apesar da aparência de um debate livre?
Não se pode esquecer que hoje passam aqui para o primeiro plano certos recursos técnicos e institucionais de produção e difusão de mensagens o que significa acoplar todo o processo midiático à indústria destes meios e consequentemente ao capital e seus processos de valorização. Este processo vai inevitavelmente vincular a comunicação ao mercado e consequentemente aos processos de mercantilização, de repressão e de acomodação dos sentidos humanos aí vigentes. Comunicação e economia se tornam processos inseparáveis.
[Manfredo Araújo de Oliveira é filósofo, professor da UFC e presidente da Adital]
Fonte: Adital
Uma resposta
Artigo excelente do PADRE MANFREDO. Padre Ocelo. Mestre em educação.