Para entender esse ministério especial no Ano Santo da Misericórdia.
Estamos celebrando o Ano Santo Extraordinário da Misericórdia, e neste tempo especial estamos todos convidados a retomar com maior intensidade o mandato missionário que Nosso Senhor Jesus Cristo deu à sua Igreja. Está assim expresso no Decreto “Ad Gentes”, do Concílio Vaticano II: “A Igreja, enviada por Deus a todas a gentes para ser “sacramento universal de salvação, por íntima exigência da própria catolicidade, obedecendo a um mandato do seu fundador procura incansavelmente anunciar o Evangelho a todos os homens” (n. 01).
Ao falar do mandato do seu Fundador, o Decreto está lembrando a passagem bíblica: “E disse-lhes [Jesus]: Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,16). Assim sendo, temos que a natureza da Igreja é missionária; desde sua origem ela foi convidada a ser uma Igreja em saída, “por isso, continua a revestir-se de grande urgência a missão ad gentes, na qual são chamados a participar todos os membros da Igreja, pois esta é, por sua natureza, missionária: a Igreja nasceu ‘em saída’” (Papa Francisco, Mensagem para o Dia Mundial das Missões 2014).
O Documento de Aparecida deixou ainda mais em evidência essa verdade missionária que não é nova, mas, pelo contrário é tão antiga e sempre provocadora. Com muito entusiasmo encontramos no referido Documento a seguinte afirmação: “Desejamos que a alegria que recebemos no encontro com Jesus Cristo (…), chegue a todos os homens e mulheres feridos pelas adversidades (…). Conhecer a Jesus é o melhor presente que qualquer pessoa pode receber; tê-lo encontrado foi o melhor que ocorreu em nossas vidas, e fazê-lo conhecido com nossa palavra e obras é nossa alegria” (DAp., n.29).
Tendo em conta essa índole missionária da Igreja, foi que o Papa Francisco deu início ao seu Pontificado. Todos somos sabedores do seu ardor missionário e de quanto é desejo do seu coração que a Igreja vá ao encontro de todas as pessoas, especialmente dos feridos, dos que estão nas periferias existenciais, como ele mesmo afirma Bula “Misericordiae Vultus”, n.15: “Neste Ano Santo, poderemos fazer a experiência de abrir o coração àqueles que vivem nas mais variadas periferias existenciais, que muitas vezes o mundo contemporâneo cria de forma dramática. Quantas situações de precariedade e sofrimento presentes no mundo atual! Quantas feridas gravadas na carne de muitos que já não têm voz, porque o seu grito foi esmorecendo e se apagou por causa da indiferença dos povos ricos”.
“Ir ao encontro!”. É essa a expressão que o Papa quer que cale profundamente nos corações dos católicos, e de modo especial daqueles que possuem o mandato de anunciar a Palavra de Deus em primeiro lugar: os Bispos, Padres e Diáconos. É assim que o Papa exorta no mesmo lugar da Bula: “Neste Jubileu, a Igreja sentir-se-á chamada ainda mais a cuidar destas feridas, aliviá-las com o óleo da consolação, enfaixá-las com a misericórdia e tratá-las com a solidariedade e a atenção devidas”. Isso significa sair em missão, não ficar nas palavras bonitas de ordem, nas quais muitos católicos e cristãos podem se deter, sem se aproximarem realmente das feridas físicas e existenciais de tantas pessoas. Essa exortação do Papa coincide com o que o diz o Decreto “Presbyterorum Ordinis”, sobre os Presbíteros, do Vaticano II: “[Os Padres] não poderiam ser ministros de Cristo se não fossem testemunhas e dispensadores de uma vida diferente da terrena, e nem poderiam servir aos homens se permanecessem alheios à sua vida e às suas situações” (n. 03).
Os Padres são convidados a serem, então, missionários, já pelo Batismo, e dispensadores da Misericórdia Divina, pela Ordem, saindo ao encontro das diversas situações da vida humana; neste aspecto inclui-se a administração do Sacramento da Reconciliação, que é lugar central onde se derrama a misericórdia de Deus sobre os corações e as mentes, como afirma o Sumo Pontífice: “Com convicção, ponhamos novamente no centro o sacramento da Reconciliação, porque permite tocar sensivelmente a grandeza da misericórdia. Será, para cada penitente, fonte de verdadeira paz interior” (MV, n.17).
Para dar uma visibilidade toda especial ao mandato missionário da Igreja – e de uma Igreja samaritana – que chegue ao encontro de todas as pessoas, é que o Papa Francisco instaurou outra novidade neste Ano Santo: o mandato dos Missionários da Misericórdia. Assim o Papa se expressa no n. 18 da Bula, que aqui reproduzimos por inteiro:
“Na Quaresma deste Ano Santo, é minha intenção enviar os Missionários da Misericórdia. Serão um sinal da solicitude materna da Igreja pelo povo de Deus, para que entre em profundidade na riqueza deste mistério tão fundamental para a fé. Serão sacerdotes a quem darei autoridade de perdoar mesmo os pecados reservados à Sé Apostólica, para que se torne evidente a amplitude do seu mandato. Serão sobretudo sinal vivo de como o Pai acolhe a todos aqueles que andam à procura do seu perdão. Serão missionários da misericórdia, porque se farão, junto de todos, artífices dum encontro cheio de humanidade, fonte de libertação, rico de responsabilidade para superar os obstáculos e retomar a vida nova do Batismo. Na sua missão, deixar-se-ão guiar pelas palavras do Apóstolo: ‘Deus encerrou a todos na desobediência, para com todos usar de misericórdia’ (Rm 11, 32). Na verdade todos, sem excluir ninguém, estão chamados a acolher o apelo à misericórdia. Os missionários vivam esta chamada, sabendo que podem fixar o olhar em Jesus, ‘Sumo Sacerdote misericordioso e fiel’ (Hb 2, 17)”.
E ainda:
“Peço aos irmãos bispos que convidem e acolham estes Missionários, para que sejam, antes de tudo, pregadores convincentes da misericórdia. Organizem-se, nas dioceses, ‘missões populares’, de modo que estes Missionários sejam anunciadores da alegria do perdão. Seja-lhes pedido que celebrem o sacramento da Reconciliação para o povo, para que o tempo de graça, concedido neste Ano Jubilar, permita a tantos filhos afastados encontrar de novo o caminho para a casa paterna. Os pastores, especialmente durante o tempo forte da Quaresma, sejam solícitos em convidar os fiéis a aproximar-se ‘do trono da graça, a fim de alcançar misericórdia e encontrar graça’ (Hb 4, 16)”.
Deste modo, o Papa quer que alguns Sacerdotes (Bispos e Padres), levem, pela pregação e pelas obras, pelo Sacramento da Reconciliação, a Misericórdia de Deus em sentido de saída missionária. Desta feita será um Ano Jubilar Missionário da Misericórdia para tantos sacerdotes que foram eleitos para este serviço de amor e de graça, pois aí se manifestará o amor misericordioso do Pai, pois “o amor nunca poderia ser uma palavra abstrata” (MV, n.09), e no Sacramento do Perdão o amor se torna concreto em sua plenitude.
Pe. Rafhael Silva Maciel
Padre da Arquidiocese de Fortaleza
Missionário da Misericórdia