O Papa Francisco tem afirmado que, para podermos agir num mundo marcado por tanta pobreza e miséria, não nos podemos contentar com a simples constatação do fato da pobreza, mas urge perguntarmos por suas causas estruturais. A CNBB fez este ano uma tentativa de esclarecer isso no caso do contexto brasileiro.
Nosso modelo econômico é sustentado principalmente por quatro eixos que têm conduzido a privilégios e à concentração da renda e da riqueza nas mãos de uma minoria, em detrimento da justa distribuição de renda e riqueza, barrando o nosso desenvolvimento socioeconômico:
- Modelo tributário regressivo, que faz com que os mais pobres paguem proporcionalmente muito mais tributos embutidos em tudo que consomem, tendo em vista que a maior parte da carga tributária está concentrada nos tributos que incidem sobre o consumo. Os elevados lucros distribuídos aos sócios por bancos e grandes empresas são isentos. As fortunas não são tributadas.
b) Sistema da dívida, que usa o instrumento de endividamento público às avessas, ou seja, em vez de servir para financiar investimentos indispensáveis à sociedade e a nosso desenvolvimento socioeconômico, como se faz nos países ricos, é utilizado para fomentar a transferência de recursos públicos para bancos e aplicadores do mercado financeiro. Isso acontece devido aos juros altos e outros mecanismos financeiros questionáveis. Há mecanismos ilegais, que extraviam receitas tributárias por fora dos controles orçamentários, que subtraem e desviam o dinheiro arrecadado de contribuintes antes que este chegue aos cofres públicos. A dívida tem sido usada como justificação para a constante imposição de cortes e teto de gastos sociais, privatizações de patrimônio público estratégico e contrarreformas que cortam direitos sociais.
c) Política monetária executada pelo Banco Central, que vincula a economia brasileira à prática de juros altíssimos e outros mecanismos prejudiciais, em especial a carência de moeda gerada pelas “operações compromissadas” e “depósitos voluntários remunerados”, que remuneram diariamente, com graves consequências, a sobra de caixa dos bancos, garantindo-lhes recordes de lucros.
d) Exploração predatória da mineração e do grande agronegócio, dirigidos unicamente para a exportação de commodities, assegurando lucros extraordinários às grandes corporações transnacionais que operam nesses ramos, desfrutando de benesses tributárias, creditícias e patrimoniais, ao mesmo tempo em que exploram a classe trabalhadora e deixam aqui a devastação ambiental e ecológica. Em paralelo, manifesta-se, nas políticas públicas,a baixa prioridade à agricultura de base familiar, que continua sendo essencial para a alimentação da sociedade brasileira.
A atividade articulada desses quatro eixos estruturantes produz o resultado previsto: o PIB mantém-se estagnado; a dívida pública explode, sem contrapartida social; o patrimônio público é rifado em privatizações questionáveis; os direitos sociais são desrespeitados; a pobreza e a desigualdade social crescem; os danos ambientais se agravam; o lucro dos bancos tem recorde e aumenta a fortuna de bilionários, ampliando o fosso social que os distancia dos miseráveis e faz do Brasil um dos países mais desiguais do mundo. Precisamos antes de tudo de um projeto de desenvolvimento humano, integral e sustentável.
Manfredo Araújo de Oliveira UFC
Foto: Vatican News