A ressurreição de Cristo suscita nos seus discípulos a consciência de que ele vive e não foi abandonado pelo Pai, mas confirmado na vida e confirmado também na obra que levou a termo. Hoje, Deus dá abertamente razão a Jesus. “Deus o ressuscitou no terceiro dia e tornou-o manifesto…” (At 10,40, 1ª Leitura). Hoje congratulamos Cristo, porque Deus mostrou que ele esteve certo naquilo que fez! É o mesmo sentido que aparece no evangelho da tarde, o acontecimento de Emaús, situado na tarde daquele “primeiro dia da semana”, o domingo de Páscoa: Jesus mesmo mostra que as Escrituras prefiguravam seu caminho (Lc 24,26). Mas agora ele vive, e, quando o pedimos, ele fica conosco (Lc 24, 29) e se dá a conhecer no “partir o pão”, a celebração da comunidade cristã (Lc 24,30).
O evangelho da manhã é outro: a corrida de Pedro e do misterioso “discípulo amado” ao sepulcro. Pedro tem a precedência, embora o outro (impulsionado pelo amor) tenha corrido mais rápido. Pedro entra primeiro, e vê. O outro vem depois: vê e crê! O amor é que faz reconhecer nos sinais da ausência (as faixas, o sudário) a presença, transformada e gloriosa, do Cristo. “Crê”, só agora, porque até então não tinha entendido as Escrituras que significam a ressurreição de Cristo dos mortos.
Com este último pensamento, nos aproximamos novamente do evangelho da tarde: a ressurreição de Cristo significa o entendimento das Escrituras. Os discípulos descobrem nas Escrituras o delicado fio – que muitos não enxergam – do engajamento da vida como realização da vontade do Pai, da missão messiânica e do Reino de Deus. À luz do Cristo ressuscitado, descobrem a estratégia central de Deus na Escritura; e à luz da Escritura, descobrem que Jesus é o Servo rejeitado, mas exaltado, de Is 53, o Messias e Filho de Deus (cf. Jo 20,30s).
Atentemos para os acontecimentos pascais na liturgia: a visita das mulheres ao sepulcro na madrugada, em seguida a visita de Pedro e o Discípulo Amado (Páscoa, manhã); o episódio de Emaús (Páscoa, tarde); o episódio de Tomé (oito dias depois) (2° dom. pascal); e assim em diante até a Ascensão e Pentecostes. E sempre o propósito de seguir Jesus passo por passo, iniciado no domingo de Ramos, “seis dias antes da Páscoa”.
Consideremos os detalhes característicos do relato evangélico de João: o amor que faz correr mais rápido, o amor que faz crer ao ver (Jo 20,9). E, no evangelho da tarde, o desenvolvimento dramático, desde a decepção dos discípulos, passando pela generosa oferta: “Fica conosco, pois está anoitecendo”, até a confissão: “Não ardia o nosso coração…? e a mensagem triunfal dos onze apóstolos: “O Senhor foi ressuscitado de verdade!” (Lc 24,34).
As orações aplicam o tema pascal à existência cristã, como faz também a 2ª leitura: “Se fostes ressuscitados com Cristo, buscai as coisas do alto” (Cl 3,1). “Eliminar o velho fermento” (1Cor 5,7), costume pascal de Israel, significa a renovação de nossa vida (cf. oração do dia; oração final). Abre-se também a perspectiva escatológica, manifestação gloriosa de nossa vida, que agora está escondida no Cristo glorioso (Cl 3,3) (cf. oração final).
O salmo responsorial é, naturalmente, o salmo pascal 118 [l17]. E não se esqueça de cantar, antes da aclamação ao evangelho, a sequência Victimae Paschali Laudes. Para nós, na América Latina, Páscoa tem um intenso sentido de libertação. “A vida venceu a morte”, canta a sequência. O domínio das forças da morte é apenas aparente. A ressurreição de Cristo mostra que a Vida que nele se manifesta é mais forte. A comunidade que se une para viver, com o Ressuscitado, a Vida que ele nos mostrou se sabe no caminho certo.
A “Páscoa” do Messias e do seu povo
Na noite do Sábado Santo para “o primeiro dia da semana, os primeiros cristãos celebravam a ressurreição do Senhor Jesus. Por isso, o primeiro dia da semana chama-se domingo, dia do Dominus, “Senhor”. Atualmente, a liturgia prevê três momentos de celebração da Páscoa: a missa da Vigília Pascal, de noite, a missa do domingo de manhã e a missa da tarde. Aprofundamos aqui o sentido da primeira celebração.
A liturgia da vigília pascal inicia com a celebração da luz nova e do círio pascal. Depois, lêem-se diversas leituras do A.T. (sete, ou no mínimo três). Uma dessas leituras (a 3ª) lembra o significado da Páscoa no A.T.: a passagem do Senhor Deus para libertar seu povo, arrancando-o das mãos dos egípcios e fazendo-o passar pelo Mar Vermelho a pé enxuto (Ex 14, 15-15,1). Para os cristãos, Páscoa é a comemoração da passagem de Jesus, da morte à glória. Deus mostrou-se mais forte que os inimigos de seu plano de amor, que mataram o Messias. O amor venceu, e ressurgiu imortal. O Messias vai agora à frente de seu povo, na “Galileia”, lugar onde se encontram os discípulos. Glorioso, o ressuscitado conduz novamente os seus fiéis, como ensina o evangelho da Vigília Pascal.
Também nós temos de realizar nossa passagem. No início da Igreja, a noite pascal era a noite em que se administrava o batismo. O batismo significa a nossa “travessia do Mar Vermelho”, a nossa descida com Cristo no sepulcro, para com ele voltar à vida nova, tornando-nos criaturas novas, mortas para o pecado, mas vivendo para Deus, em Cristo (leitura do Novo Testamento, depois do Glória festivo). Na Vigília Pascal renovamos o nosso compromisso batismal. Morremos e ressuscitamos com Cristo. Essa renovação do compromisso batismal é o “selo” que confirma a conversão empreendida na quaresma. A profissão de fé na Páscoa, em torno; da água batismal benzida na mesma hora, é renovação de nosso batismo, uma “míni-ressurreição”. Mas a consolidação da nossa conversão deve mostrar-se, sobretudo, em nossa prática da caridade e justiça. A Campanha da Fraternidade não terminou; devemos consolidá-la pela prática de nossa vida renovada!
Então a alegria da Páscoa não será por causa do coelhinho e dos presentes que o comércio avidamente nos forneceu. Será a alegria de quem passou da morte para a vida, trilhando os passos de Jesus. Será também a alegria do novo povo de Deus, que segue seu Messias. E esta alegria será verdadeira, somente se este povo realiza o amor e a fraternidade pelos quais Cristo deu a sua vida. Mostrará por sua vida que o amor de Cristo foi vitorioso.
Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes
Fonte: franciscanos.org