Foto: Vatican News
Uma consideração, mesmo superficial, é capaz de nos fazer ver que a crise ambiental avança e se agrava, gerando eventos extremos em todo o mundo, o que aumenta o drama social dos atingidos. Apesar disto e da mobilização mundial, não está sendo fácil transformar os padrões de relação da economia com a natureza e, igualmente, os padrões de consumo dos mais ricos. O Brasil aparece no centro do debate mundial: por sua contribuição à devastação ambiental, que aumentou enormemente nos últimos anos com o desmonte de políticas públicas referentes a esta questão, e pelo potencial que tem de ser parte fundamental da solução desta crise central em nosso contexto epocal.
Os desafios são enormes. Temos um Congresso com maioria de opositores onde pautas antiambientais proliferam, sendo inclusive o governo instado a reestruturar seus ministérios. Depois, a coligação de forças presente no governo tem contradições: sem dúvida, há uma declaração de um projeto de governo que tem no enfrentamento da questão ambiental um de seus objetivos centrais; mas há também certos projetos desenvolvimentistas que não consideram a questão socioambiental em sua integralidade.
Sem dívida há um início da retomada das competências estatais desmobilizadas na área ambiental. Exemplo claro foi a criação de pastas inéditas na história da gestão pública como foi o caso da criação do Ministério dos Povos Indígenas bem como das políticas de transição energética e das ações estratégicas para o combate ao desmatamento. Apesar disto, os biomas continuam sofrendo com o desmatamento.
Em relação aos povos originários, tradicionais e indígenas, ainda há muito o que fazer. Questões como línguas, demografia, legislação, demarcação e proteção das Terras Indígenas (entre 2019 e 2022 nenhuma terra indígena foi demarcada), política indigenista e projetos de desenvolvimento ainda são merecedoras de mais atenção dos governos. Houve nos últimos anos talvez o maior ataque de nossa história aos direitos indígenas. A área devastada por atividade nas Terras indígenas da Amazônia cresceu 495% entre 2010 e 2020, em grande parte através da mineração ilegal. Faz-se necessária uma prioridade urgente para se poder garantir que tais fatos não voltem a ocorrer em nossa história.
O caso escandaloso dos Yanomani é enigmático: uma tragédia humanitária que impactou o mundo inteiro, de fome, miséria, explorações, resultado de omissões e de ações de vários atores, públicos e privados. As reações, até agora, não foram capazes de solucionar o drama daqueles povos e certamente se pode ter a impressão de que a comissão do Congresso que acompanha esta crise humanitária dá mais espaço aos interesses dos garimpeiros do que à busca de solução para as atividades ilegais e prejudiciais através de políticas públicas. Tudo indica que o poder dos garimpeiros ainda continua muito forte. Não se pode perder a vigilância permanente da sociedade civil. Diz o Papa Francisco (Laudato Si, n. 189): “A política não deve submeter-se à economia… Pensando no bem comum, hoje precisamos imperiosamente que a politica e a economia, em diálogo, se coloquem decididamente ao serviço da vida, especialmente da vida humana”.
Manfredo Oliveira, UFC