Fraternidade e Fome

Para o papa Francisco, a missão da igreja consiste em inserir-se no mundo e abrir-se às alegrias e às esperanças, às tristezas e às angústias dos homens e das mulheres de hoje, sobretudo dos pobres e atribulados. Daí a tarefa urgente: reabrir-se ao mundo para exercer o serviço da evangelização, ou seja, “sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho”. O papa Francisco faz, em sua Exortação Apostólica “A Alegria do Evangelho”, uma afirmação fundamental para a atuação da Igreja na sociedade: “Já não se pode afirmar que a religião deve limitar-se ao âmbito privado e serve para preparar almas para o céu”. Assim: “Uma fé autêntica…comporta sempre um desejo de mudar o mundo, transmitir valores, deixar a terra um pouco melhor, depois de nossa passagem por ela”. A Igreja para cumprir sua missão no mundo, precisa compreender a forma de articulação estrutural que marca a sociedade, ou seja,” as instituições que regulam as relações humanas” (Laudato SÍ, 2015, 142), numa palavra, tudo o que diz respeito à ordem social e à consecução do bem comum.

A Quaresma é entendida como um tempo de conversão, pessoal e coletiva, pois a fé possui uma dimensão social. Assim, cada ano, a Igreja Católica reflete, durante a quaresma, sobre sua atuação no mundo o que significa em primeiro lugar uma tomada de consciência da situação histórica em que está inserida. Este ano põe no centro de sua reflexão a terrível problemática da fome, que, como afirmou o papa, é não só uma tragédia, mas também uma vergonha. No texto da campanha se afirma que “viver com fome, a ponto de perder a própria dignidade, arrastar-se pela rua, revirar o lixo e morrer de fome não é algo natural ou desejado por Deus. No Brasil, a fome é não simplesmente um problema ocasional, é fenômeno social e coletivo, estrutural, produzido e reproduzido no curso ordinário da sociedade, que normatiza e naturaliza a desigualdade, é um projeto de manutenção da miséria em vista da perpetuação no poder”.

A fome entre nós é um escândalo de proporções inimagináveis: em abril de 2022, “58/1% dos domicílios viviam em algum nível de Insegurança Alimentar, dos quais 15,5% conviviam com a fome. Em números absolutos, isso significa que do total de uma população de 211,700 milhões, 125,2 milhões convivem coma alguma Insegurança Alimentar, dentre os quais mais 33 milhões enfrentam a fome em nosso país. São 15,5% da população brasileira”.

O papa Francisco afirma sobre as causas estruturais desta situação: “Além disto, é doloroso constatar que que a luta contra a fome e a subalimentação é obstada pela “prioridade do mercado” e pela “primazia do lucro”, que reduziram os alimentos a uma mercadoria qualquer, sujeita a especulações, até financeiras. E quando se fala de novos direitos, o faminto está ali, na esquina da rua, e pede o direito de cidadania… Pede-nos dignidade, não esmola”. “O ser humano…tem fome de justiça”.

Manfredo Oliveira, UFC

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