«Que formosos são sobre os montes os pés do mensageiro que anuncia a paz» (Is 52, 7)!
Com estas palavras inicia o Papa Francisco, sua Mensagem para o Dia Mundial da Paz – 1º de janeiro de 2022. Toda a mensagem é luminosa e deverá ser levada profundamente em consideração como orientação para todo o Ano Novo 2022, que está iniciando.
Aqui não queremos que fazer éco às palavras do Santo Padre, ressaltando apenas alguns títulos que nos chamam a atenção. Deveremos, no entanto, ir diretamente à Mensagem em sua integridade.
“Estas palavras do profeta Isaías manifestam a consolação, o suspiro de alívio dum povo exilado, extenuado pelas violências e os abusos, exposto à infâmia e à morte. Sobre esse povo, assim se interrogava o profeta Baruc: «Por que estás tu em terra inimiga, envelhecendo num país estrangeiro? Contaminaste-te com os mortos, foste contado com os que descem ao Hades» (3,10-11). Para aquela gente, a chegada do mensageiro de paz significava a esperança dum renascimento dos escombros da história, o início dum futuro luminoso.
Como nos tempos dos antigos profetas, continua também hoje a elevar-se o clamor dos pobres e da terra para implorar justiça e paz.
Em cada época, a paz é conjuntamente dádiva do Alto e fruto dum empenho compartilhado.
… Todos podem colaborar para construir um mundo mais pacífico partindo do próprio coração e das relações em família, passando pela sociedade e o meio ambiente, até chegar às relações entre os povos e entre os Estados.
Quero propor, aqui, três caminhos para a construção duma paz duradoura. Primeiro, o diálogo entre as gerações, como base para a realização de projetos compartilhados. Depois, a educação, como fator de liberdade, responsabilidade e desenvolvimento. E, por fim, o trabalho, para uma plena realização da dignidade humana. São três elementos imprescindíveis para tornar «possível a criação dum pacto social», sem o qual se revela inconsistente todo o projeto de paz.”
Primeiro caminho: Dialogar entre gerações para construir a paz.
“Num mundo ainda fustigado pela pandemia, que tem causado tantos problemas, «alguns tentam fugir da realidade, refugiando-se em mundos privados, enquanto outros a enfrentam com violência destrutiva, mas, entre a indiferença egoísta e o protesto violento há uma opção sempre possível: o diálogo, [concretamente] o diálogo entre as gerações».
Todo o diálogo sincero, mesmo sem excluir uma justa e positiva dialética, exige sempre uma confiança de base entre os interlocutores. Devemos voltar a recuperar esta confiança recíproca. A crise sanitária atual fez crescer, em todos, o sentido da solidão e o isolar-se em si mesmos. Às solidões dos idosos veio juntar-se, nos jovens, o sentido de impotência e a falta duma noção compartilhada de futuro. Esta crise é sem dúvida aflitiva, mas nela é possível expressar-se também o melhor das pessoas. De fato, precisamente durante a pandemia, constatamos nos quatro cantos do mundo generosos testemunhos de compaixão, partilha, solidariedade.
Dialogar significa ouvir-se um ao outro, confrontar posições, pôr-se de acordo e caminhar juntos. Favorecer tudo isto entre as gerações significa amanhar o terreno duro e estéril do conflito e do descarte para nele se cultivar as sementes duma paz duradoura e compartilhada.
Enquanto o progresso tecnológico e económico frequentemente dividiu as gerações, as crises contemporâneas revelam a urgência da sua aliança. Se os jovens precisam da experiência existencial, sapiencial e espiritual dos idosos, também estes precisam do apoio, carinho, criatividade e dinamismo dos jovens.
Os grandes desafios sociais e os processos de pacificação não podem prescindir do diálogo entre os guardiões da memória – os idosos – e aqueles que fazem avançar a história – os jovens –; tal como não é possível prescindir da disponibilidade de cada um dar espaço ao outro, nem pretender ocupar inteiramente a cena preocupando-se com os seus interesses imediatos como se não houvesse passado nem futuro. …”
Segundo caminho: A instrução e a educação como motores da paz.
“Nos últimos anos, diminuiu sensivelmente a nível mundial o orçamento para a instrução e a educação, vistas mais como despesas do que como investimentos; e, todavia, constituem os vetores primários dum desenvolvimento humano integral: tornam a pessoa mais livre e responsável, sendo indispensáveis para a defesa e promoção da paz. Por outras palavras, instrução e educação são os alicerces duma sociedade coesa, civil, capaz de gerar esperança, riqueza e progresso.
Ao contrário, aumentaram as despesas militares, ultrapassando o nível registado no termo da «guerra fria», e parecem destinadas a crescer de maneira exorbitante .
Por conseguinte é oportuno e urgente que os detentores das responsabilidades governamentais elaborem políticas econômicas que prevejam uma inversão na correlação entre os investimentos públicos na educação e os fundos para armamentos. Aliás a busca dum real processo de desarmamento internacional só pode trazer grandes benefícios ao desenvolvimento dos povos e nações, libertando recursos financeiros para ser utilizados de forma mais apropriada na saúde, na escola, nas infraestruturas, no cuidado do território, etc. …
É necessário, portanto, forjar um novo paradigma cultural, através de «um pacto educativo global para e com as gerações jovens, que empenhe as famílias, as comunidades, as escolas e universidades, as instituições, as religiões, os governantes, a humanidade inteira na formação de pessoas maduras». Um pacto que promova a educação para a ecologia integral, segundo um modelo cultural de paz, desenvolvimento e sustentabilidade, centrado na fraternidade e na aliança entre os seres humanos e o meio ambiente .
Investir na instrução e educação das novas gerações é a estrada mestra que as leva, mediante uma específica preparação, a ocupar com proveito um justo lugar no mundo do trabalho .”
Terceiro caminho: Promover e assegurar o trabalho constrói a paz.
“O trabalho é um fator indispensável para construir e preservar a paz. Aquele constitui expressão da pessoa e dos seus dotes, mas também compromisso, esforço, colaboração com outros, porque se trabalha sempre com ou para alguém. Nesta perspetiva acentuadamente social, o trabalho é o lugar onde aprendemos a dar a nossa contribuição para um mundo mais habitável e belo.
A pandemia Covid-19 agravou a situação do mundo do trabalho, que já antes se defrontava com variados desafios. Faliram milhões de atividades económicas e produtivas; os trabalhadores precários estão cada vez mais vulneráveis; muitos daqueles que desempenham serviços essenciais são ainda menos visíveis à consciência pública e política; a instrução à distância gerou, em muitos casos, um retrocesso na aprendizagem e nos percursos escolásticos. Além disso, os jovens que assomam ao mercado profissional e os adultos precipitados no desemprego enfrentam hoje perspetivas dramáticas. Particularmente devastador foi o impacto da crise na economia informal, que muitas vezes envolve os trabalhadores migrantes. …
Com efeito o trabalho é a base sobre a qual se há de construir a justiça e a solidariedade em cada comunidade. Por isso, «não se deve procurar que o progresso tecnológico substitua cada vez mais o trabalho humano: procedendo assim, a humanidade prejudicar-se-ia a si mesma. O trabalho é uma necessidade, faz parte do sentido da vida nesta terra, é caminho de maturação, desenvolvimento humano e realização pessoal». Temos de unir as ideias e os esforços para criar as condições e inventar soluções a fim de que cada ser humano em idade produtiva tenha a possibilidade, com o seu trabalho, de contribuir para a vida da família e da sociedade.
Como é urgente promover em todo o mundo condições laborais decentes e dignas, orientadas para o bem comum e a salvaguarda da criação! É necessário garantir e apoiar a liberdade das iniciativas empresariais e, ao mesmo tempo, fazer crescer uma renovada responsabilidade social para que o lucro não seja o único critério-guia.
Nesta perspetiva, devem ser estimuladas, acolhidas e sustentadas as iniciativas, a todos os níveis, que solicitam as empresas a respeitar os direitos humanos fundamentais de trabalhadoras e trabalhadores, sensibilizando nesse sentido não só as instituições, mas também os consumidores, a sociedade civil e as realidades empresariais. … E todos aqueles que intervêm neste campo, a começar pelos trabalhadores e empresários católicos, podem encontrar orientações seguras na doutrina social da Igreja.”
Finalmente o apelo do Papa Francisco nos chama a todos para percorrer estes caminhos na construção de uma paz verdadeira para todos.
“Aos governantes e a quantos têm responsabilidades políticas e sociais, aos pastores e aos animadores das comunidades eclesiais, bem como a todos os homens e mulheres de boa vontade, faço apelo para caminharmos, juntos, por estas três estradas: o diálogo entre as gerações, a educação e o trabalho. Com coragem e criatividade. Oxalá sejam cada vez mais numerosas as pessoas que, sem fazer rumor, com humildade e tenacidade, se tornam dia a dia artesãs de paz. E que sempre as preceda e acompanhe a bênção do Deus da paz!” [Excertos da Mensagem do Papa Francisco para o 55º. Dia Mundial da Paz!]