Novembro chega e, saudosos e ao mesmo tempo confortados pela fé, somos chamados a pensar na morte como nossa inimiga comum, quando todos são colocados em pé de igualdade na celebração do Dia de Finados. Mas, de acordo com o Livro Sagrado, na parábola do rico e do pobre Lázaro, no capítulo 16 de São Lucas, o futuro ou a sorte das pessoas são antagônicos: o rico passa por tormentos e Lázaro experimenta a plenitude e é recompensado no seio do Pai Abraão. São incontáveis os Lázaros, a partir da utopia do Reino, que se revelam na Escritura, manifestação nítida do mistério da graça de Deus, na caminhada dos seguidores de Jesus de Nazaré, esplendor a iluminar o mundo e na História.
O rico da referida parábola representa o poder do demônio, fechado num sistema excludente, gerador de uma enorme massa de miseráveis: mendigos, desempregados e ladrões, que saqueiam para não morrer de fome, sem esquecer dos milhões de refugiados e migrantes espalhados pelo mundo inteiro. O Lázaro nessa parábola deixa claro que Deus se associa à vida infra-humana do povo excluído, dando a entender, aos cristãos de todos os tempos, o compromisso com seu projeto de amor solidário, compreendido na manifestação da vontade divina, em assumir a vida humana, pessoal e coletiva, na busca da dignidade, num mundo novo e transfigurado.
Somos chamados a pensar na graça de Deus, convencidos de que o mesmo Senhor, afável e terno, nos ama e toma a iniciativa, por seu filho Jesus Cristo, através da Igreja, sacramento de salvação. Já faz 34 anos e ainda me recordo um pouco do estudo da teologia sobre o Tratado da Graça, na Universidade Católica (PUC-RS), com o Pe. Olavo Moesche. Sempre muito cristalino, ele deixou na minha mente que Deus nos ama; também no que há de mais belo e maravilhoso no mistério do amor: o dom e a graça. E que somos filhos de Deus e que nos é permitido chamar de Pai! É Ele quem nos torna novas criaturas, inserindo-nos em sua vida e no mistério trinitário: Pai, Filho e Espírito Santo.
É claro que Deus espera, da parte da criatura humana, uma resposta livre, a partir da existência do seu ser, mas numa vida exemplar, com as marcas da fé, esperança e caridade, num amor comprometido e gerador de comunhão, no serviço aos irmãos. Que nossa resposta nos faça livres, ao experimentar a graça de Deus, mistério de amor. Assim, somos convidados, no dom e na graça, à luz da esperança cristã, a pensar na transitoriedade da vida, a partir do Dia de Finados, que nos permite reorganizar a vida, unidos aos nossos irmãos e amigos falecidos. Amém!
*Escritor, blogueiro, colunista, vice-presidente da Previdência Sacerdotal e Pároco de Santo Afonso, Parquelândia, Fortaleza-CE –[email protected]