O Papa em sua audiência com os Prelados Auditores do Tribunal da Rota Romana para a inauguração do Ano Judiciário
Francisco recebeu os Prelados Auditores do Tribunal da Rota Romana, aos quais recomendou discernimento “de joelhos” nos processos de nulidade dos matrimônios. Aos juízes, o Papa recomendou a oração: “Um juiz que não sabe se ajoelhar é melhor que peça demissão”.
Mariangela Jaguraba – Vatican News
O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta quinta-feira (25/01), na Sala Clementina, no Vaticano, os Prelados Auditores do Tribunal da Rota Romana por ocasião da inauguração do Ano Judiciário.
Francisco refletiu com eles sobre um aspecto importante desse serviço: o discernimento. “Pretendo me concentrar naquele discernimento específico que cabe a vocês realizar nos processos matrimoniais, no que diz respeito à existência ou não de motivos para declarar a nulidade de um matrimônio”, disse o Papa.
“É um tema sempre atual, que também tocou o âmbito da reforma implementada dos processos de nulidade matrimonial, bem como a pastoral familiar, inspirada pela misericórdia para com os fiéis que se encontram em situações problemáticas”, sublinhou o Pontífice.
O Tribunal da Rota Romana lida com os delicados e às vezes dolorosos julgamentos de casos de nulidade matrimonial, dos quais Francisco pede que favoreçam “não a nulidade dos matrimônios, mas a celeridade dos processos, com uma justa simplicidade, de modo que por causa da demora na definição do julgamento, o coração dos fiéis que esperam o esclarecimento de seu estado não seja oprimido por muito tempo pela escuridão da dúvida”.
Essa misericórdia, tão enfatizada na Exortação Amoris laetitia, “não diminui o nosso compromisso na busca da justiça no que diz respeito às causas de nulidade. Pelo contrário, à luz da misericórdia, da misericórdia para com as pessoas e suas consciências, é importante o discernimento judicial em relação à nulidade”, enfatiza o Papa.
“Como vocês bem sabem, por sua própria experiência, a tarefa de julgar muitas vezes não é fácil”, disse ainda o Papa. O discernimento para alcançar a certeza moral sobre a nulidade é “uma grande responsabilidade que a Igreja lhes confia, porque influencia fortemente a vida das pessoas e das famílias”, disse Francisco aos Prelados Auditores do Tribunal da Rota Romana.
Devemos enfrentar esta tarefa com coragem e lucidez, mas, antes de tudo, é fundamental contar com a luz e a força do Espírito Santo. Queridos juízes, sem a oração vocês não podem ser juízes. Se alguém de vocês não reza, por favor, peça demissão. É o melhor assim.
É, portanto, um discernimento que se faz “de joelhos implorando o dom do Espírito Santo”. Segundo Francisco, “essa é a única maneira de chegar a decisões que vão na direção do bem das pessoas e de toda a comunidade eclesial”. E insistiu, dizendo: “Um juiz que não sabe se ajoelhar é melhor que peça demissão”.
Ao mesmo tempo, a objetividade do discernimento judicial exige “estar livres de qualquer preconceito, tanto a favor quanto contra a declaração de nulidade”. Isto, explicou o Papa Francisco, implica libertar-se tanto do “rigorismo de quem pretende uma certeza absoluta” quanto de “uma atitude inspirada na falsa convicção de que a resposta melhor seja sempre a nulidade”, aquilo que São João Paulo II chamou de “risco de uma compaixão mal compreendida, apenas aparentemente pastoral”.
O discernimento do juiz requer duas grandes virtudes: a prudência e a justiça, que devem ser informadas pela caridade.
Uma prudência que diz respeito a um ato declarativo sobre a existência ou não do bem do matrimônio; portanto, uma prudência jurídica que, para ser verdadeiramente pastoral, deve ser justa. O discernimento justo implica um ato de caridade pastoral, mesmo quando a sentença for negativa. E também um risco.
O discernimento sobre a validade do vínculo é uma operação complexa, a respeito da qual não devemos esquecer que a interpretação da lei eclesiástica deve ser feita à luz da verdade sobre o matrimônio indissolúvel, que a Igreja preserva e difunde em sua pregação e missão.
A seguir, o Papa pediu aos juízes para “sentir com a Igreja”. Depois, perguntou: “Vocês rezam para sentirem-se com a Igreja? Vocês são humildes na oração, pedindo luz ao Senhor, para sentir-se com a Igreja? Volto a isto: a oração do juiz é essencial para a sua tarefa. Se um juiz não reza ou não pode rezar, é melhor que faça outro trabalho.”
Por fim, um lembrete sobre a sinodalidade: “Quando o tribunal é colegial, como costuma acontecer, ou quando há apenas um juiz, mas ele consulta os que têm autoridade, o discernimento é realizado em uma atmosfera de diálogo ou discussão, na qual a franqueza e a escuta mútua são fundamentais, para uma busca comum da verdade. É também um estudo prévio, sério”, disse o Papa Francisco.
Nesse serviço, é essencial invocar o Espírito Santo e comprometer-se “a empregar todos os meios humanos para averiguar a verdade”. É importante, portanto, que “a investigação preliminar seja realizada com cuidado”, recomendou o Papa, “para não incorrer em um julgamento apressado e apriorístico”, assim como é necessário que “o juiz cultive sua própria formação permanente através do estudo da jurisprudência e da doutrina jurídica”.