Um Ano da Esperança para construir a Paz

Iniciamos 2014 sob o sinal da Esperança na construção da Paz. Para nós na Arquidiocese de Fortaleza será este o Ano da Esperança, segundo ano no triênio de preparação para o Jubileu Centenário da Arquidiocese. Para toda a humanidade, nos votos e mensagem do Papa Francisco, a Paz se constrói com a Fraternidade, fundamento e caminho para a Paz.

Para a humanidade é possível esperar por um mundo de Paz. E “A Esperança não decepciona” (Rom 5,5 ), quando se constrói o presente e o futuro com a fraternidade.  E será de se esperar a fraternidade entre todos os povos, nações, raças, línguas que parecem dividir a humanidade ao invés de uni-la?

Papa Francisco abriu sua mensagem de Ano Novo 2014: “Na realidade, a fraternidade é uma dimensão essencial do homem, sendo ele um ser relacional. A consciência viva desta dimensão relacional leva-nos a ver e tratar cada pessoa como uma verdadeira irmã e um verdadeiro irmão; sem tal consciência, torna-se impossível a construção duma sociedade justa, duma paz firme e duradoura. E convém desde já lembrar que a fraternidade se começa a aprender habitualmente no seio da família, graças sobretudo às funções responsáveis e complementares de todos os seus membros, mormente do pai e da mãe. A família é a fonte de toda a fraternidade, sendo por isso mesmo também o fundamento e o caminho primário para a paz, já que, por vocação, deveria contagiar o mundo com o seu amor”.

Já por razão natural toda pessoa humana se reconhece semelhante a outras pessoas humanas das quais nasce, com as quais vive e se relaciona. A primeira experiência de relacionamento humano é o intrafamiliar, e ele se expande à medida em que a vida se desenvolve. O horizonte humano se amplia e vai até a universalidade da humanidade que o irmana.

Mais que todas as diferenças pessoais, familiares, sociais, nacionais, de raça, cor, religião, cultura, há uma semelhança que irmana no destino comum de todos.

E esta fraternidade universal não clama, também, ela mesma, por uma filiação universal, por uma paternidade universal?

Mas… há sempre um mas…

Com o mesmo Papa Francisco todos constatamos: “Em muitas partes do mundo, parece não conhecer tréguas a grave lesão dos direitos humanos fundamentais, sobretudo dos direitos à vida e à liberdade de religião. Exemplo preocupante disso mesmo é o dramático fenômeno do tráfico de seres humanos, sobre cuja vida e desespero especulam pessoas sem escrúpulos. Às guerras feitas de confrontos armados juntam-se guerras menos visíveis, mas não menos cruéis, que se combatem nos campos econômico e financeiro com meios igualmente demolidores de vidas, de famílias, de empresas”.

Vivemos a globalização que, como afirmou Bento XVI, “nos torna vizinhos, mas não nos faz irmãos.” Continuam e mesmo crescem mais as situações de desigualdade, pobreza e injustiça que indicam não só a falta de fraternidade, mas também de uma cultura de solidariedade. Existe, sim, e agride a todos o individualismo, o egocentrismo e o consumismo materialista, a mentalidade do “descartável” que leva ao desprezo e abandono dos mais fracos, daqueles que são considerados “inúteis”, dos que não contam.  Assim, a convivência humana torna-se relação de comércio e de desfrute e domínio egoísta.

A humanidade necessita de paternidade, da Paternidade que fundamenta sua própria fraternidade e que dá consistência aos relacionamentos fraternos entre todas as pessoas humanas. O reconhecimento desta paternidade divina, transcendente, deste Amor que é fonte de Vida, leva ao amor verdadeiro entre os que são irmãos e irmãs, leva ao cuidado do outro, de todos, e a partir do mais frágil, do mais fraco, do mais necessitado. A referência muda totalmente. Já não é o “eu” o centro da existência, é o “outro”, será afinal o “nós” unidos pelo Amor do que o Outro de todos juntos.

Este cuidado do irmão está presente nas intenções do Pai Criador desde a origem. É ele mesmo quem pergunta ao homem homicida: «Onde está o teu irmão?» (Gn 4, 9)

Esta busca pelo homem fragilizado nas relações marcou toda a ação reveladora e salvadora de Deus na história da humanidade.

Vale a pena retornar às mesmas palavras do Papa Francisco em sua mensagem de início de ano: “Surge espontaneamente a pergunta: poderão um dia os homens e as mulheres deste mundo corresponder plenamente ao anseio de fraternidade, gravado neles por Deus Pai? Conseguirão, meramente com as suas forças, vencer a indiferença, o egoísmo e o ódio, aceitar as legítimas diferenças que caracterizam os irmãos e as irmãs?”

”Parafraseando as palavras do Senhor Jesus, poderemos sintetizar assim a resposta que Ele nos dá: dado que há um só Pai, que é Deus, vós sois todos irmãos (cf. Mt 23, 8-9). A raiz da fraternidade está contida na paternidade de Deus. Não se trata de uma paternidade genérica, indistinta e historicamente ineficaz, mas do amor pessoal, solícito e extraordinariamente concreto de Deus por cada um dos homens (cf. Mt 6, 25-30). Trata-se, por conseguinte, de uma paternidade eficazmente geradora de fraternidade, porque o amor de Deus, quando é acolhido, torna-se no mais admirável agente de transformação da vida e das relações com o outro, abrindo os seres humanos à solidariedade e à partilha ativa.”

“Em particular, a fraternidade humana foi regenerada em e por Jesus Cristo, com a sua morte e ressurreição. A cruz é o ‘lugar’ definitivo de fundação da fraternidade que os homens, por si sós, não são capazes de gerar. Jesus Cristo, que assumiu a natureza humana para redimi-la, amando o Pai até a morte e morte de cruz (cf. Fl 2, 8), por meio da sua ressurreição constitui-nos como humanidade nova, em plena comunhão com a vontade de Deus, com o seu projeto, que inclui a realização plena da vocação à fraternidade.”

Aqui se fundamenta toda a nossa Esperança de que a humanidade poderá encontrar o seu Caminho. É possível a Fraternidade. É não apenas desejável, mas realizável a Paz. Será possível a fraternidade vencer a exclusão, o empobrecimento. É possível uma economia a favor da humanidade na solidariedade e não contra ela. A fraternidade extingue todas as guerras, as corrupções, os crimes organizados. A fraternidade ajudará a guardar, a preservar, a cultivar, a conviver solidariamente com a natureza.

Vale terminar esta nossa conversa com as palavras do próprio Papa Francisco: “Há necessidade que a fraternidade seja descoberta, amada, experimentada, anunciada e testemunhada; mas só o amor dado por Deus é que nos permite acolher e viver plenamente a fraternidade”.

+ José Antonio Aparecido Tosi Marques

Arcebispo Metropolitano de Fortaleza

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